DOM FERNANDO CARDEAL BORGHIA
Cardeal Presbítero di Santa Maria in Domnica.
Por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica,
Prefeito do Dicastério para a Promoção da Unidade dos Cristãos.
“Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te e pratica as primeiras obras” (Ap 2,4-5).
Amados irmãos e irmãs em Cristo,
A mensagem à Igreja de Éfeso, contida nas cartas do Apocalipse, ecoa com profundidade em nossos dias. Ela nos chama a um retorno à autenticidade do amor cristão, que é a essência da fé e o fundamento da unidade entre os discípulos de Cristo.
O Senhor exorta a Igreja de Éfeso a lembrar-se de seu primeiro amor. Este amor, vivido com fervor no início, é o amor que abraça a Deus com todo o coração, alma e entendimento (Mt 22,37) e que se desdobra em caridade para com o próximo. Este amor, porém, tende a esfriar quando não é alimentado pela oração, pela Palavra e pela comunhão com os irmãos. Os Padres da Igreja, como Santo Agostinho, recordam que "ama e fazes o que queres", porque o amor autêntico conduz sempre à prática das virtudes e à fidelidade a Cristo. O amor inicial que nos une a Deus é a força que também nos une como cristãos, superando divisões. Quando voltamos ao primeiro amor, voltamos ao ponto em que Cristo é o centro de tudo, e, Nele, encontramos a unidade verdadeira.
A Igreja de Éfeso foi elogiada por odiar as obras dos nicolaitas, os quais deturpavam a doutrina cristã e corrompiam a pureza moral. Os nicolaitas representavam um perigo interno, um comprometimento com práticas mundanas que minavam a fé genuína.
Na busca pela unidade cristã, é essencial discernir o que ameaça a integridade da doutrina e da vida cristã. Como alertou São João Paulo II: “A unidade não pode ser alcançada às custas da verdade”. Devemos amar os irmãos em Cristo, mas rejeitar tudo o que deturpa a verdade do Evangelho, sempre com mansidão e firmeza, como nos exorta São Pedro: “Estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança, mas com mansidão e temor” (1Pd 3,15).
A oração sacerdotal de Cristo ressoa como um apelo contínuo: "Que todos sejam um, como tu, ó Pai, estás em mim e eu em ti, para que o mundo creia" (Jo 17,21). A unidade dos cristãos não é um projeto humano, mas uma resposta ao desejo do coração de Cristo. Voltarmos ao primeiro amor implica reconhecer que a divisão entre os cristãos é um escândalo que enfraquece o testemunho do Evangelho no mundo. A unidade exige conversão diária, renúncia ao orgulho e abertura para amar aqueles com quem temos diferenças. Santo Tomás de Aquino afirma que a caridade é o vínculo da perfeição (Col 3,14), unindo-nos a Deus e aos irmãos.
- Lembrar-se de onde caímos: Identificar os momentos em que o amor se esfriou e as divisões se instalaram.
- Arrepender-se: Reconhecer com humildade nossas falhas no amor a Deus e ao próximo.
- Praticar as primeiras obras: Reavivar a oração, a leitura das Escrituras e as obras de caridade.
São Cipriano de Cartago nos adverte: "Não pode ter Deus como Pai quem não tem a Igreja como mãe." Assim, fortalecer a unidade eclesial é parte essencial de nossa resposta ao chamado ao primeiro amor.
Amados, o Senhor nos chama a uma fé vibrante, a um amor ardente e a uma unidade que seja sinal para o mundo. Que possamos, como a Igreja de Éfeso, ouvir a voz do Espírito e voltar ao nosso primeiro amor, rejeitando toda prática que corrompa a verdade. Peçamos a intercessão de Maria, Mãe da Unidade, para que sejamos testemunhas vivas de um só corpo e um só Espírito, em Cristo, nossa paz.
“Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (Ap 2,7).
Dado em Roma, Cidade Eterna, no décimo segundo dia do primeiro mês do ano de 2025, do nascimento de N. S. Jesus Cristo, na solenidade do Batismo do Senhor.