ENCÍCLICA APOSTOLICA
PEREGRINANTES IN FIDEM ET SPES
(Peregrinos na Fé e na Esperança)
DA NATUREZA EVANGÉLICA DO
APOSTOLADO VIRTUAL
DO SUMO PONTÍFICE
BONIFÁCIO
SERVO DOS SERVOS DE DEUS
Aos Cardeais, Bispos, Presbíteros e Diáconos; Aos religiosos, religiosas, consagrados e consagradas; aos esposos, aos que laboram e a todos vós, que esta minha Carta-Encíclica Apostólica lerem, saúde, paz e benção apostólica lhes sejam concedidas com abundância.
PROEMIO
O mandato missionário de Cristo: fundamento da ação apostólica
1. “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura.” (Mc 16,15). — Estas palavras do Mestre, pronunciadas após a Sua Ressurreição e antes da Sua gloriosa Ascensão, encerram em si todo o dinamismo missionário da Igreja. São palavras que não se limitam a um tempo e nem a uma geografia; ao contrário, elas estendem-se a toda a criação e a todos os tempos, tornando cada batizado partícipe do mandato apostólico do Cristo.
2. Irmãos, a evangelização não é acessória, não é opcional, muito menos é decorativa: é essencial, é vital, é constitutiva do ser cristão. E é exatamente por esta razão que a Santa Igreja, desde os seus primórdios, nunca cessou de anunciar a Verdade, mesmo diante das perseguições, dos desertos ou novos desafios culturais e tecnológicos dos tempos hordiernos.
3. Aos apóstolos, aos mártires, aos missionários e às religiosas que atravessaram oceanos, países, mandando legados de gerações, dando a própria vida pela Igreja e pela Santificação das gentes, somam-se hoje aqueles que, tocados pelo mesmo Espírito, transpõem os muros do silêncio e da solidão virtual para semear o Evangelho nos areópagos digitais.
4. Se São Paulo utilizou as vias romanas para ir às comunidades, se os Santos Padres usaram os códices e epístolas, se os missionários do século XIX evangelizaram com a imprensa nascente, por que não reconhecer que os nossos dias exigem discípulos-missionários que caminhem pelos circuitos das plataformas, pelas salas dos jogos, pelos fóruns e chat‘s onde milhões de pessoas estão presentes, muitas vezes sem saber que anseiam por Deus?
INITIUM
Os novos areópagos da missão
5. O Concílio Vaticano II já anunciava, com lucidez, na Constituição Gaudium et Spes, que “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (GS, 1).
6. Ora, há hoje milhões de adolescentes, jovens e adultos que, movidos por interesses diversos — culturais, recreativos ou afetivos — encontram-se em plataformas digitais, como o nosso Habblet Hotel, ou então o Habbo Hotel, e outros espaços similares. Lá constroem relações, partilham experiências, projetam identidades e, tantas vezes, buscam inconscientemente um sentido, um consolo, e também um caminho para a Verdade.
7. A Igreja não pode — e nem deve — olhar para estes ambientes com suspeita ou desprezo. Pelo contrário, como nos ensinou o Papa Bento XVI: “A missão da Igreja tem de recorrer com coragem às novas tecnologias, conscientes de que estas não são apenas instrumentos de comunicação, mas são parte integrante da vida dos jovens.” (Mensagem para o 43º Dia Mundial das Comunicações Sociais, 2009)
8. Por isso, os que actuam como evangelizadores nestes ambientes não podem ser julgados ou desconsiderados com a pejorativa nomenclatura de “jogadores de RPG” ou meros “personagens de simulação”. Pois ali, por detrás de cada um/a, há uma pessoa. E onde há uma pessoa, há uma oportunidade de conduzir à salvação.
Da missão do apostolado católico nas plataformas.
9. Com particular atenção, desejo aqui trazer à consideração do Povo de Deus um caso concreto de apostolado: a fundação da Igreja Católica no Habbo Hotel, no ano de 2006, que conheceu interrupções, intempéries, culminando no surgimento de novos núcleos evangelizadores, como o nosso, no Habblet Hotel em 2010.
O que moveu esses jovens e adolescentes na maioria a assumirem um papel importante, mesmo num espaço amplamente não-religioso, foi o mesmo chamado que um dia tocou os corações de Simão e André: “Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.” (Mt 4,19)
Eles ouviram a voz do Senhor. E à semelhança de tantos santos que encontraram meios inusitados para levar Cristo às almas — desde teatros improvisados, como São Felipe Néri, até quadrinhos, como o Beato Tiago Alberione —, estes evangelizadores contemporâneos serviram-se do virtual para anunciar o real: Jesus Cristo Vivo, Ressuscitado e Presente, que não desiste e não se cansa de nos perdoar e amar.
10. Atribuir o rótulo de “jogadores de RPG” é reduzir o Evangelho, a fé, a vocação a um passatempo. Tal linguagem, além de imprecisa, fere. Fere o zelo de tantos jovens que são sinal visível da presença de Deus nos lugares mais improváveis, como este, onde tantas vidas se escondem e precisam ainda do amor de Deus.
A verdade do apostolado
11. Nos últimos tempos, têm surgido vozes dissonantes dentro e fora das comunidades católicas no virtual, que procuram descredibilizar o trabalho dos que ainda zelam pelo apostolado.
12. Reconhecendo que em um todo o apostolado deve ser conduzido com pureza, sobriedade e fidelidade à doutrina, é necessário afirmar que por mais exista má conduta de indivíduos, não invalida a nobreza do apostolado em si. A Igreja sempre caminhou entre santos e pecadores, mas jamais ela deixou de ser Santa.
13. É justamente por respeito à missão confiada por Cristo e à santidade do que se faz, que se deve rejeitar, com firmeza, a definição de “Role Play Game” (Jogo de Interpretação de Papéis) aplicada a comunidades católicas virtuais. RPG pode incluir fantasia, ficção, relativismo e liberdade sem vínculos; já o apostolado exige obediência, verdade, testemunho e coerência de vida.
“A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração.” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, 14)
14. E essa atração só ocorre quando o mundo vê a fé viva — mesmo que expressa nestes ambientes — e reconhece ali o toque do Espírito.
O sopro do Espírito Santo
15. “O vento sopra onde quer; ouves-lhe o ruído, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que nasceu do Espírito.” (Jo 3,8). O Espírito Santo, alma da Igreja e seu motor invisível, sopra em todos os corações, até nos nossos, despertando em nós os mais diversos dons e carismas. Não se pode aprisionar o Espírito dentro das fronteiras d das estruturas visíveis, tampouco limitar a sua ação apenas aos meios tradicionais de evangelização.
16. O mundo virtual, com seus paradoxos e complexidades, não escapa ao alcance de Deus, nem ao sopro do Espírito. Como já reconhecia o tão amado Papa São João Paulo II: “A internet oferece possibilidades sem precedentes para a evangelização. Deve-se promover uma presença cristã na rede, não como uma imposição, mas como testemunho.” (Mensagem para o 36º Dia Mundial das Comunicações Sociais, 2002)
E é nesse sopro misterioso, mas perceptível, que reconhecemos a presença do Espírito Santo nos apostolados católicos em plataformas como o Habblet Hotel e demais ambientes similares.
17. Com esforço contínuo e com perseverança, estes irmãos e irmãs erguem estes espaços com finalidades de escuta, da oração, da catequese, da fraternidade e do anúncio — muitas vezes sem receberem apoio, outra vezes perseguidos, mas sustentados apenas pela certeza de que “o amor de Cristo nos impele” (2Cor 5,14).
18. A pergunta que deve guiar o discernimento da Igreja quanto a qualquer realidade emergente não é "de onde vem?", mas "quais frutos ela produz?"; pois “Toda árvore boa dá bons frutos.” (Mt 7,17).
19. Os frutos do apostolado virtual são visíveis: tantas conversões, as reconciliações, as vocações despertadas, o crescimento na oração, o interesse pela doutrina, o retorno aos sacramentos, mas o mais importante de tudo: o alívio da solidão.
Frutos reais, colhidos por pessoas reais, mesmo que cultivados num ambiente digital. Não deve jamais ser descartado.
Um testemunho vivo onde o Espírito Santo toca vidas.
20. Entre os inúmeros exemplos vivos do nosso apostolado, recordo-me com particular carinho a memória do nosso amado irmão Nicolas Matheus, jovem, seminarista, que exerceu também o seu papel fundamental no desenvolvimento da Igreja Católica em plataformas virtuais e que, em 2020, foi chamado à Casa do Pai, na realidade.
21. Quando estava conosco, e eu era o Papa Paulo IV, em um Consistório, ele deixou um testemunho que permanece guardado em meu coração até hoje e cuja mensagem tenho salva, vide: “Levem isso aqui bem sério. Pois isso aqui que me motivou ainda mais na caminhada.” Palavras simples, mas profundas. São elas a expressão de uma verdade que transcende todos os sentidos: o virtual pode ser lugar de encontro autêntico com o próprio Deus.
22. Outrossim assinalado Nicolas, igual modo, devo também assinalar o seu (é nosso) amado Beato Carlo Acutis, jovem italiano, beatificado em 2020 e será canonizado em Outubro.
Ele é hoje o Patrono da evangelização virtual e proclamado pelos nossos predecessores João Paulo VII e Alexandre IV.
Criador de uma plataforma online que mapeou os milagres eucarísticos do mundo inteiro, Carlo ofereceu a sua criatividade e conhecimento informático ao serviço da fé, demonstrando que a santidade e o teclado não são incompatíveis, mas complementares quando o coração está unido a Cristo. Ele mesmo dizia que “Todos nascem como originais, mas muitos morrem como cópias.”
23. É também esta originalidade — evangelizar onde ninguém imaginava ser possível — que se vê no clero virtual e nas comunidades online. Não estão a fingir a fé; estão a viver a fé onde vivem os outros que precisam dessa mesma fé.
O apelo à seriedade no apostolado
24. Como em todo ambiente humano, os apostolados digitais também correm o risco da corrupção, do desvio e da vaidade. Escândalos de cunho sexual, disputas por títulos, egoísmo, simulacros de autoridade e manipulação da fé para interesses pessoais têm, infelizmente, surgido em certos contextos e ameaçado a credibilidade de projetos sérios.
25. Aqui, é necessária uma advertência clara e intransigente: quem faz do nome da Igreja um pretexto para escândalo, abuso ou idolatria da própria imagem, está a trair o Evangelho e a causar feridas no Corpo de Cristo. Tal comportamento, por mais que se esconda sob o manto de uma suposta “evangelização lúdica”, não pode ser tolerado, porque “Não se pode servir a dois senhores.” (Mt 6,24).
26. O apostolado virtual, para ser autêntico, deve ser humilde, transparente, obediente e comprometido com a Verdade. Não é palco, não é simulação, muito menos é sinônimo de vaidade. É serviço e missão.
27. Por isso, cabe a cada um dos envolvidos nestas plataformas um discernimento contínuo, uma profunda vida de oração e uma constante formação doutrinal. E aos que engajam comunidades virtuais, recordo a responsabilidade que assumem — pois: “A quem muito foi dado, muito será exigido.” (Lc 12,48)
A nossa identidade no ambiente
28. A pergunta fundamental que devemos fazer diante da presença da Igreja nos ambientes digitais não é apenas “o que fazemos aqui?”, mas sobretudo “quem somos aqui?”
Diante das acusações reducionistas que qualificam o clero virtual como um jogo de interpretação, é necessário afirmar: os clérigos no mundo virtual e os leigos não interpretam papéis — eles vivem um chamado.
Ainda que assumam nomes fictícios para facilitar a interação ou proteger a privacidade, são pessoas reais, com fé verdadeira, que desejam viver e comunicar o Evangelho, mesmo através de meios não convencionais. Pois todos “Somos templos do Espírito Santo” (1Cor 6,19).
30. A dignidade do batismo não se dilui com o uso de um teclado. A missão do cristão não se suspende ao entrar em uma plataforma virtual. O selo da fé não se apaga quando o evangelizador se expressa por um avatar. Tudo aquilo que é feito em nome de Cristo, com retidão de coração, é uma verdadeira participação no ministério e na missão confiada à própria Igreja.
31. É por isso que afirmamos: o que se realiza nestas plataformas não é RPG — é apostolado. RPG envolve fantasia, construção de mundos fictícios, simulação voluntária de papéis sociais ou épicos com liberdade criativa. Já o apostolado envolve um vasto campo missionário. Ele brota da Palavra, ele é sustentado pela oração, é discernido à luz da Tradição e da doutrina católica, pronto e disposto a caminhar nos ensinamentos Católicos e no Magistério.
32. Portanto, rejeitamos com firmeza qualquer associação do apostolado católico virtual com práticas meramente fictícias, ludicidade vazia ou simulação ociosa. A vida cristã — mesmo quando encarnada em ambientes não físicos — é sempre resposta ao chamado de Deus.
A plataforma digital como campo de missão
33. “Lançai as redes para a pesca.” (Lc 5,4) — As redes sociais, os jogos online, as plataformas de interação, tudo o que tenha envolvimento à digitalidade, são hoje os grandes mares da contemporaneidade, onde multidões navegam, muitas vezes sem rumo, outras vezes em fuga, outras ainda em busca de um porto de sentido.
34. Neste contexto, a Igreja deve ser como a barca de Pedro, lançando redes não para dominar, mas para salvar. Os apostolados virtuais e os que estão engajados a eles, são pescadores de almas, conscientes de que os ambientes digitais não são espaços neutros, mas territórios onde as sementes devem ser lançadas para dar fruto.
“As redes sociais podem ser, de facto, um lugar humanizado, não obstante os seus riscos.” (Papa Francisco, Mensagem para o 48º Dia Mundial das Comunicações Sociais, 2014)
35. Vemos com clareza que a evangelização nas pltaformas digitais não é moda, nem é passatempo, e nem distração. É um campo de salvação, um areópago moderno, um território que precisa ser consagrado à luz do Evangelho.
36. Muitos jovens entram nestes ambientes para escapar da dor do mundo real. Lá, vivem rejeições, são julgados, ofendidos, desprezados. São almas feridas que, na sua fragilidade, encontram nestes meios, um consolo, uma palavra, um afeto, um gesto de ternura, um chamado à esperança, e nós somos os portadores disso! Porque se a Igreja não for até eles, quem irá então?
Chamados a ser âncoras de Cristo
37. “A esperança é a âncora da alma.” (Hb 6,19) num mundo cada vez mais fluido, instável e digitalmente disperso, o testemunho da Igreja precisa ser como uma âncora. E essa âncora, como outrora lançada nas águas do Tiberíades, deve hoje ser lançada nas redes digitais, nas plataformas de socialização.
38. É por isso que, longe de ser uma ficção, o trabalho dos engajados aos cleros digitais é missão concreta, visível e eficaz. Eles estão a lançar as âncoras da fé, da oração, da conversão e da proximidade.
Muitos foram já “pescados” por essas âncoras invisíveis e hoje vivem uma fé mais consciente, mais profunda e mais alegre — graças a uma primeira semente lançada no ambiente virtual.
39. “Cristo não é uma ideia, nem uma doutrina, mas uma pessoa viva que deseja entrar em comunhão connosco.” (São João Paulo II, Novo Millennio Ineunte, 29). E é essa comunhão que os apostolados digitais estão a promover — não com teatralidade, mas com zelo pastoral. Não com encenações, mas com verdadeira fé e autenticidade.
40. Ao ver estes frutos e esta dedicação, reconhecemos: esta é a Igreja viva. Esta é a Igreja dos novos tempos. Esta é a Igreja que ouve, acolhe, evangeliza e acompanha, inclusive através dos seus missionários digitais.
A sucessão no mundo virtual
41. Uma das objeções levantadas contra o apostolado digital é a ausência de uma sucessão apostólica sacramental, tal como a conhecemos no episcopado e no presbitério da Igreja hierárquica.
42. Embora esta observação seja teologicamente verdadeira no que diz respeito à ordenação sacramental, não invalida a realidade de uma sucessão espiritual e missionária que se transmite entre os clérigos virtuais, de geração em geração.
43. Como nos primeiros tempos da Igreja, onde tantos mártires não pertenciam à hierarquia mas foram verdadeiros transmissores da fé, assim também hoje reconhecemos que há uma continuidade apostólica carismática e missionária nas plataformas digitais, quando os evangelizadores agem em comunhão com a fé católica e em sintonia com o Magistério.
A sucessão não está apenas no sacramento, mas também no espírito. Como afirma o Concílio Vaticano II: “A Igreja peregrinante é missionária por sua própria natureza.” (Ad Gentes, 2)
Se há continuidade de uma missão, da sã doutrina, do testemunho e da caridade, então há sim uma forma legítima e reconhecível de herança, especialmente quando confirmada pelos frutos do Espírito: amor, paz, paciência, bondade, fidelidade. (cf. Gl 5,22-23).
44. Por isso, ao recordar a figura do jovem Nicolas Matheus, um dos nossos pioneiros, recordamos não apenas a sua memória, mas o legado que plantou e que germinou em tantos outros. O seu testemunho é uma herança viva, é uma sucessão, é fermento escondido na massa.
45. Assim também nós, somos o elo de uma corrente que liga corações à eternidade. E mesmo que não sejam ordenados, são enviados. E não desistem de utilizar das plataformas para chegar a todos, sem exceção.
Chamados à seriedade
46. “Se hoje ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações.” (Sl 95,7-8) — A evangelização digital não pode ser encarada como um passatempo entre tantos. Não pode ser reduzida a uma recreação ou a um jogo de imaginação.
47. Evangelizar é uma missão sagrada. É um ato de grande responsabilidade. Nas palavras de um dos irmãos que participaram deste caminho: “Levem isso aqui sério. Pois isso aqui que me motivou ainda mais na caminhada.”
Essas palavras devem ecoar como um chamado para todos aqueles que participam ou desejam participar do apostolado católico neste meio virtual. Este campo não é uma fantasia, mas um berço de vocações; é um lugar de discernimento e um solo fecundo de escuta e seguimento.
48. A seriedade, porém, não se expressa por formalismos ou por rigidez, mas por coerência de vida, por um espírito de oração, pelo compromisso com a verdade. Não é necessário vestir paramentos para ser missionário — mas é essencial vestir-se de Cristo. (cf. Rm 13,14). Não se exige títulos, mas se exige autenticidade. Não se exige perfeição, mas se exige fidelidade e somente isso.
“Não fostes vós que me escolhestes, mas fui Eu que vos escolhi e vos destinei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça.” (Jo 15,16)
49. Levar isso a sério significa entender que o apostolado digital pode (e deve) salvar almas. Pode encaminhar os jovens ao sacerdócio, despertar as vocações à vida consagrada, restaurar os lares, reconciliar os corações feridos e acender em muitos a chama viva e ardente do Evangelho.
Um compromisso livre de escândalos
50. No entanto, não basta evangelizar. É preciso evangelizar com seriedade. A autenticidade do testemunho cristão é o selo mais visível da nossa fé. A linguagem, as atitudes, as decisões e os ambientes construídos nas plataformas digitais devem ser reflexo da santidade da Igreja, e não da mundanidade dos sistemas sem Deus. O próprio São Pedro nos exorta: “Sede santos, porque Eu sou Santo.” (1Pd 1,16)
51. Escândalos, divisões, vaidades, disputas de poder, usurpação de títulos ou linguagem dúbia — tudo isso deve ser rejeitado de imediato. Tais coisas comprometem não apenas a credibilidade do apostolado, mas ofendem o próprio Cristo, que nos chamou à integridade.
52. O apostolado digital não é lugar para ídolos de si mesmos, nem para alimentar egos feridos ou frustrações não resolvidas. Deve ser uma escola de humildade, que viva a fraternidade, o amor e a obediência.
Recordemos o chamado do Senhor: “Aquele que escandalizar um destes pequeninos que crêem em Mim, melhor seria que lhe amarrassem ao pescoço uma mó de moinho e o lançassem no fundo do mar.” (Mt 18,6)
Uma Igreja em saída
53. “Ide, pois, fazei discípulos entre todas as nações.” (Mt 28,19) — O mandato de Jesus é claro: ir. Mas ir não significa apenas atravessar cidades, fronteiras ou oceanos. Significa sair de nós mesmos, romper com o comodismo, abandonar as estruturas da segurança que tantas vezes paralisam a ação pastoral.
54. Como nos recordava o saudoso Papa Francisco: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e pela comodidade de se agarrar às próprias seguranças.” (Evangelii Gaudium, 49)
55. O ambiente digital é uma dessas estradas. Ali, a Igreja deve sair: com prudência, sim; com discernimento, sim; mas com coragem. Não se trata de conquistar espaço, mas de tornar Cristo conhecido, amado e seguido. A Igreja não deve temer os novos tempos — pois o Senhor é o Senhor da História, e não há tempo ou espaço onde Ele não possa reinar.
56. Os que aqui se movem não são figurantes. São discípulos missionários que ouviram o convite: “Quem quiser vir após Mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me.” (Mt 16,24). Nós assumimos essa cruz com humildade.
Exortação
57. “Sereis os apóstolos dos últimos tempos.” (Nossa Senhora de La Salette). Inspirado pelo Espírito Santo, movidos pelo zelo, e após julgar necessário a publicação deste Motu Proprio, defino e estabeleço com autoridade apostólica:
i) Que o apostolado católico exercidos em ambientes virtuais e plataformas digitais, constituem legítimas expressões de evangelização, quando orientados pela doutrina da Igreja, sustentados através da oração e dirigidos à salvação das almas.
ii) Que a nomenclatura “RPG” (Role Play Game) não deve, doravante, ser aplicada a estas realidades do nosso apostolado, pois deturpa a sua natureza missionária e fere a seriedade do que ali se realiza. Tais comunidades não são jogos, mas campos pastorais, ambientes de fé, de conversão e de discipulado.
iii) Que os bispos, presbíteros e diáconos acolham e acompanhem com espírito de escuta e discernimento esta forma de apostolado, reconhecendo nele uma ação concreta do Espírito que sopra onde quer.
58. Aos jovens, adultos, catequistas, fundadores e fiéis comprometidos com a evangelização no mundo digital, digo-vos em nome de Cristo: Não desanimeis. Não desistam. Permanecei firmes. “Sede firmes, inabaláveis, sempre ativos na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não é em vão.” (1Cor 15,58)
59. Mesmo que o mundo vos ridicularize, mesmo que outros irmãos na fé vos ignorem ou desdenhem, sede fiéis. Pois o Senhor, que vê o oculto, recompensará cada palavra semeada. Sejais sal da terra e luz do mundo, também no mundo virtual.
60. Confiando tudo isso ao Imaculado Coração de Maria, Estrela da Evangelização, e ao patrocínio do Beato Carlo Acutis, vos concedo, de coração paternal, a minha bênção apostólica, invocando sobre vós o Espírito Santo, para que vos fortaleça na missão de levar Cristo aos confins da terra — e da internet.
Dado em Roma, junto a São Pedro, aos vinte dias de julho do ano jubilar da esperança de dois mil e vinte cinco. Domingo décimo-sexto do Tempo Comum é primeiro do meu Pontificado.
